Tratamento da Dependência Química – Adicção (atualizado 2020)

Formas de Tratamento da Dependência Química – Adicção (Drogas, Álcool e Fármacos)

Como boa parte da minha atuação dentro da psiquiatria é na área do Tratamento da Dependência Química, recebo um número considerável de familiares e pacientes querendo iniciar o tratamento.

Neste breve texto gostaria de esclarecer o correto fluxograma na busca por ajuda para o tratamento de dependentes químicos.

Tento explicar as várias modalidades de tratamento da dependência química / adicção, incluindo algumas ferramentas mais específicas.

O artigo foi publicado pela 1a vez em 2011 com o título original “Formas de Tratamento da Adicção”. Com algumas adaptações apresentei esses conceitos na forma de palestras em grupos de Amor-Exigente e para pais e professores em escolas. E de forma mais aprofundada e técnica, como aulas em residências médicas e multiprofissionais e em cursos de formação, capacitação e especialização em Dependência Química para profissionais de saúde.

O que é adicção? Como se faz o diagnóstico de Dependência Química?

Se você leu outros textos antes de chegar ao portal KIAI.med.br deve ter lido várias vezes que a dependência química é considerada uma doença crônica, incurável, progressiva e potencialmente fatal quando não tratada.

Uso neste texto o termo adicção como sinônimo de dependência química ao longo do texto, seguindo a tendência mundial de tratar o problema mesmo quando a relação do usuário com a droga ainda não desenvolveu os marcadores da dependência física propriamente (tolerância aos efeitos da droga e abstinência quando da retirada da mesma).

O objetivo deste artigo não é descrever o diagnóstico da dependência química. No portal poderão encontrar os critérios diagnósticos utilizados pelos especialistas para o correto estabelecimento do diagnóstico da adicção:

Tratamento da Dependência Química – É caso de internação?

Geralmente a busca de informações pela internet acabará levando a sites de clínicas, comunidades terapêuticas ou para os chamados “captadores” de pacientes.

Todas essas opções irão em geral indicar a internação como forma definitiva de tratamento da dependência química, quando não a única.

Fuja dessas informações – lembre-se: são vendedores querendo vender um produto somente!

A internação de dependentes químicos é uma das modalidades de tratamento da adicção. Não a única. E raramente definitiva. Somente um médico poderá dizer se o seu caso ou de seu familiar tem realmente indicação de internação.

Para quem não conhece os “captadores”, trata-se de um fenômeno no mínimo curioso neste universo do tratamento da dependência química. Geralmente têm sites bem posicionados na pesquisa patrocinada do Google que não informam o endereço exato ou nome da clínica. Muitas vezes afirmam ter várias clínicas de dependência química como se fossem todas parte de uma rede. Na prática são atravessadores que intermediam as internações, funcionando como um serviço de vendas terceirizado das clínicas de dependência química, mas sem nenhum vínculo formal com elas. Trata-se de um negócio lucrativo, já que envolve uma comissão. A taxa habitual que uma parte das clínicas paga para estes “captadores de pacientes” é a 1a mensalidade do tratamento. É bastante comum que um tratamento de 4 meses, p.ex., seja “parcelado” em 5x. Na prática cobra-se da família uma parcela extra para acomodar essa taxa de captação.

Tratamento ambulatorial da dependência química

Nos casos em que o paciente dependente químico aceita a existência do problema, antes de pensar numa internação, procure um profissional especializado.

Agende uma consulta com um psiquiatra e/ou passe por uma avaliação com um psicólogo – de preferência ambos com experiência no tratamento da dependência química.

Tratamento Psiquiátrico

O tratamento da dependência química nem sempre envolve a prescrição de medicações!

Talvez a função mais importante do psiquiatra especialista em dependência química seja identificar as chamadas comorbidades.

Comorbidade – Significado e Importância do Tratamento

De forma resumida, o significado de comorbidade é a presença de outros transtornos psiquiátricos associados a dependência química.

Sem o diagnóstico e tratamento adequado de uma comorbidade, a chance de sucesso no tratamento da dependência química / adicção será reduzida.

Por exemplo, imagine um portador de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) dependente químico de cocaína. Ele consegue entrar em recuperação, deixando de usar a droga. Mas começa a ter dificuldades no trabalho. Passa a correr mais risco de recaída, já que entende que a droga melhorava seu rendimento profissional. Quando cheirava cocaína conseguia participar de forma mais ativa de reuniões ou trabalhava até mais tarde com mais energia por exemplo. Se for identificada a comorbidade, e se receber o tratamento adequado, ao menos esse fator para recaída estaria mais controlado.

Outro exemplo comum envolve o portador de um transtorno ansioso grave que é alcoolista. Tão logo interrompe o uso de álcool começa a ter dificuldades para dormir, sente-se mais nervoso, preocupado e irritado com os familiares. Fica fácil imaginar que corre um risco maior de recaída, certo? Afinal, após algum tempo sem beber, a lembrança dos efeitos positivos do álcool ganha força. Os pensamentos de que sofria menos por antecipação, que era mais sociável e que dormia com mais facilidade ganham força a cada semana.

Tratamento Medicamentoso da Abstinência

Em algumas situações as medicações psiquiátricas (psicofármacos) podem ser prescritas para aliviar sintomas de abstinência, que são comuns no início do tratamento da dependência química.

Existem medicações psiquiátricas que podem causar dependência, e não devem ser usadas por dependentes químicos obviamente.

Caso contrário o paciente deixa de usar álcool ou outras drogas mas se torna um farmacodependente. O objetivo do tratamento psiquiátrico não é substituir uma droga por outra!

Por isso é importante que o profissional tenha alguma experiência no tratamento da adicção.

Tratamento Psicológico

O acompanhamento psicológico é extremamente importante no tratamento da dependência química, e se possível / disponível deve ser iniciado o mais rápido possível.

Algumas modalidades específicas de psicoterapia costumam ser mais indicadas nesta fase inicial do tratamento da dependência química / adicção.

Especialmente no início do tratamento costumo sugerir profissionais especialistas em Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), Terapia Racional-Emotiva-Comportamental (TREC) ou Terapia Estratégica.

As teorias cognitivistas e comportamentais difundiram-se e ganharam espaço no arsenal terapêutico da Saúde Mental nas últimas décadas, lastreadas em um grande volume de pesquisas publicadas.

No caso do tratamento da dependência química têm importância ainda maior, já que a adicção se manifesta através de alterações nas esferas do pensamento, das emoções e do comportamento – e no geral têm uma proposta de buscar resultados em espaço mais curto de tempo.

Contudo acompanhei incontáveis casos de pacientes que conseguiram se recuperar em psico-terapia com psicólogos formados em várias outras linhas!

Sempre que indico psicoterapia para algum paciente enfatizo a importância fundamental do vínculo terapeuta-cliente.

É importante sentir a empatia do profissional desde o início.

O paciente deve sentir-se seguro dentro do consultório do psicólogo.

E se sentir que o terapeuta não lhe entende, deve no mínimo sentir que existe uma real motivação para compreensão por parte do profissional.

Caso contrário, não insista e procure outro profissional – obviamente isso vale para seu psiquiatra também!

Grupos de Mútuo-Ajuda “Anônimos”

Sugiro também que tanto o paciente quanto sua família procurem conhecer algum grupo de mútuo-ajuda.

Num país continental como o nosso Brasil, com realidades socioculturais radicalmente distintas, muitas vezes o único tratamento disponível são esses grupos anônimos.

O grupo mais conhecido é o AA (Alcoólicos Anônimos), amplamente difundido no Brasil e no mundo. Os Alcoólicos Anônimos surgiram em 1935, a partir do encontro de “Bill W e Dr. Bob”, dois alcoolistas que conseguiram se ajudar a conquistar a manter a sobriedade após terem tentado todos os tratamentos disponíveis na época. De sua experiência surgiram os hoje famosos “12 passos”, que são codificados no “Livro Azul” do AA. O único requisito para participar e ser membro do AA é o desejo de parar de beber. Não existem taxas ou mensalidades e não estão ligados a nenhuma religião, apesar de utilizarem salas disponibilizadas por igrejas para as reuniões.

A partir do AA, e seguindo os mesmos princípios dos 12 passos, surgiu o NA (Narcóticos Anônimos), voltado para usuários de drogas. O NA se define como um programa de total abstinência de todas as drogas e há somente um requisito para ser membro: o desejo de parar de usar.

Nos EUA existe também o MA (Marijuana Anonymous), igualmente derivado ao AA mas focado nos usuários de maconha / cannabis.

Para os familiares existem os grupo associados / derivados do AA e do NA, que seguem a mesma filosofia dos “12 passos”. No caso dos familiares de alcoolistas existe o Grupo Familiares AL-ANOM, e para os dependentes químicos o NAR-ANOM.

Outra opção é o Amor Exigente, programa iniciado pelo Padre Haroldo Rahm em 1984 a partir da adaptação do programa americano Tough Love.

O envolvimento das famílias no tratamento é de suma importância.

Sabemos que muitas atitudes dos familiares mais próximos acabam gerando facilitações ao estilo de vida descompromissado do adicto, dentro do conceito de codependência.

Os grupos de apoio familiar têm se firmado como opções mais acessíveis que a terapia familiar profissional na mudança estrutural necessária na recuperação do dependente.

Internação do Dependente Químico

Decidir quando internar o dependente químico é tarefa complexa.

Uma das indicações de internação na dependência química é a falência do tratamento ambulatorial.

Isso ocorre, por exemplo, quando o paciente está fazendo o tratamento adequado, usando as medicações corretamente, passando em psicoterapia regularmente, frequentando reuniões do AA ou do NA, e ainda assim não consegue controlar o uso das substâncias.

Deve-se avaliar se o tratamento que alegam estar fazendo de fato é o adequado, já que muitos pacientes tentam manipular seus familiares e os profissionais visando manter sua adicção!

O sucesso do tratamento da dependência química depende especialmente da motivação do indivíduo para a mudança (veja post sobre “Estágios Motivacionais da Mudança de Prochaska e DiClemente”). E sabemos que a motivação para a mudança é algo que flutua durante o tratamento da adicção.

Trabalhar a motivação do indivíduo é fundamental, portanto. Somente um especialista pode avaliar se o lapso ou recaída no uso da substância é indicação de internação ou não. Isso porque uma internação indicada no momento indevido pode ser entendida pelo paciente como uma punição, o que atrapalharia o processo de amadurecimento esperado.

A recusa do tratamento ambulatorial pode ser uma indicação de internação também, mas neste caso a decisão se complica ainda mais. Isso porque, além de indicar o tratamento em regime de internação, essa internação será involuntária (contra a vontade do paciente).

Tratamento da Dependência Química no SUS – “CAPS-ad”

Importante reforçar, estamos falando de pacientes cujas famílias não dependem do atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS), onde a porta de entrada para o tratamento em localidades onde o recurso existe seriam os CAPS-ad (Centro de Atenção Psicossocial para pacientes com problemas decorrentes do abuso e dependência de substâncias).

Infelizmente são poucas as localidades que contam com tal aparelho – e talvez o mais triste seja o sucateamento de parte dos mesmos, com longas filas de espera e escassez de profissionais qualificados, especialmente longe dos grandes centros.

Então, aos familiares e pacientes cabe a fiscalização, cobrança e denúncia da falta de serviços ou da inadequação dos mesmos quando for o caso, assim como o fariam caso estivessem pagando diretamente um hospital ou clínica particular (em caso de dúvida, procure o Ministério Público de sua região, tente falar diretamente com a promotoria da cidadania, responsável por assuntos ligados à saúde pública).

Internação Voluntária x Internação Involuntária do Dependente Químico

Quando existir indicação médica, internações voluntárias de variadas durações podem auxiliar o processo de recuperação do indivíduo.

Elas podem ter como objetivo somente a desintoxicação inicial, geralmente em clínicas especializadas, com duração média de 15-60 dias, auxiliando a quebrar o padrão de comportamento compulsivo.

Caso se identifique a necessidade de tratamento mais prolongado, o paciente poderá ser levado para internação em comunidades terapêuticas – nestes casos a duração média gira em torno de 90-180 dias.

Mas independente da duração da internação, não devem ser entendidas como tratamentos definitivos, mas somente como uma parte ou fase do tratamento da dependência química / adicção!

A internação involuntária é aquela que acontece contra a vontade do paciente. Ela pode ser necessária por exemplo nos casos em que o paciente não aceita o prejuízo causado pela droga. Ou quando o funcionamento mental/cognitivo está tão comprometido pelo uso da substância que ele não consegue perceber este prejuízo.

Importante destacar que a legislação brasileira é bastante clara: somente um médico especialista pode determinar a necessidade de internação.

Mesmo quando identifico a necessidade de tratamento em regime de internação de caráter involuntário, procuro insistir com o paciente para que aceite voluntariamente a internação.

Em minha experiência esse cuidado aumenta a aderência ao tratamento posterior.

Mesmo que nesse momento eu só consiga convencer a aceitação de um tratamento breve para desintoxicação.

Muitas vezes após a desintoxicação e alívio da abstinência inicial o paciente ganha consciência da necessidade de mudanças e passa a aceitar o tratamento adequado.

Antes da desintoxicação a capacidade do adicto recusar o uso da droga depende de força de vontade quase sobre-humana, já que a droga ainda circula por sua corrente sanguínea, e o sistema dopaminérgico (veja post sobre o papel da Fissura ou Craving na dependência química explicando a função dopaminérgica) está bastante deteriorado.

Onde internar o dependente químico?

Leia adiante as definições técnicas dos diferentes serviços existentes. Tratamos até o momento dos serviços ambulatoriais, que incluem consultórios médicos, psiquiátricos e psicológicos. Nesta parte final do artigo vamos detalhar os diferentes tipos de serviços que trabalham em “regime fechado” ou de internação. Eles incluem clínicas psiquiátricas, clínicas de recuperação especializadas e comunidades terapêuticas.

A escolha do local de internação deve equilibrar benefícios e riscos.

Os benefícios se relacionam com os objetivos do tratamento. Os riscos com a estrutura do serviço. Infelizmente a relação entre ambos não é diretamente proporcional.

Quando internar em Hospital Psiquiátrico?

A Síndrome de Abstinência ao Álcool é potencialmente a mais grave entre as diversas substâncias. Passadas algumas horas do último gole de álcool, iniciam os sintomas de disautonomia. Surgem tremores de extremidades e base de língua, picos hipertensivos em indivíduos não hipertensos (ou piora do quadro hipertensivo nestes), taquicardia, taquipnéia, sudorese… Em alguns casos surge confusão mental devido alteração do nível de consciência, alucinações visuais (delirium tremens), com risco de coma e até parada cardiorrespiratória.

Faz-se necessária a administração de doses de benzodiazepínicos em quantidade suficiente para restabelecer o balanço entre os sistemas inibitórios (GABAérgico, que recebe forte ação do álcool, e quando na sua privação entre em total desequilíbrio) e excitatórios (glutamatérgico), impedindo a progressão para quadros convulsivos e ao risco da hipertensão levar a acidentes vasculares cerebrais, ou mesmo a insuficiência respiratória demandar a intubação orotraqueal do paciente. O quadro conhecido como delirium tremens por exemplo possui mortalidade estimada em cerca de 30% dos casos sem o correto tratamento! Fica claro que uma estrutura adequada pode ser responsável pela salvação (ou não) da vida do paciente…

Muitas clínicas, especialmente particulares, aceitam qualquer tipo de internação. Mas a estrutura de uma clínica que possa tratar com segurança estes tipos de casos requer a presença 24h:

  • Equipe Médica (Especialistas em Clínica Médica e/ou Psiquiatra)
  • Equipe de Enfermagem (Enfermeiro e Técnicos de Enfermagem)

Clínicas especializadas geralmente não possuem os recursos necessários para atender situações de risco de vida. Por isso devem contar com planos de emergência bem definidos. São as chamadas “rotas de fuga”, tendo hospitais clínicos com pronto-socorro com estrutura adequada além de veículos disponíveis para o transporte dos pacientes quando necessário.

Somente Enfermarias Psiquiátricas em Hospitais Gerais ou Clínicas Psiquiátricas deveriam aceitar pacientes com gravidade maior (p.ex. com risco de vida por complicações físicas ou por risco de suicídio).

Comunidades Terapêuticas

Diferencie as chamadas Comunidades Terapêuticas (quer sejam as ligadas às várias religiões, quer sejam as administradas e operadas por indivíduos que cumpriram tratamentos semelhantes, buscaram formação técnica, e hoje coordenam o trabalho de reabilitação) de Clínicas de Psiquiátricas que atendem dependentes químicos.

São recursos diferentes, apesar de boa parte das Comunidades Terapêuticas adotarem como nome fantasia “Clínica”!

Comunidades Terapêuticas são regidas por portaria específica da ANVISA (RDC29/2011, que revogou a RDC101/2001), onde o tratamento segue o tradicional modelo Minnesota, inicialmente adotado pelos Alcoólicos Anônimos, e depois pelos Narcóticos Anônimos, oferece um programa ao mesmo tempo simples e bem elaborado de 12 passos rumo à recuperação plena.

Nestes serviços os pacientes permanecem por períodos pré-determinados em contrato – o tempo para cumprir um programa pré-estabelecido pela equipe técnica responsável.

O conceito de comunidade terapêutica é antigo – o psiquiatra britânico Maxwell Jones escrevia sobre ela na década de 1950, quando participou da criação de um híbrido entre Hospital Psiquiátrico e Comunidade Terapêutica.

De acordo com o George De Leon, maior autoridade mundial sobre o assunto, as comunidades seriam a reprodução em escala da vida em comunidade “real”, porém sem a presença de álcool ou drogas, e com regras claras de controle sobre qualquer tipo de ato antissocial.

Nas Comunidades Terapêuticas existem alguns problemas comuns.

Geralmente os profissionais, tanto psiquiatra quanto psicólogo não participam das determinações da condução do caso.

O tratamento é baseado no convívio entre os pares, então a presença de profissionais especializados não é obrigatória.

Até aí nenhum problema, desde que o projeto terapêutico seja honesto e especifique a estrutura de pessoal envolvida no tratamento dos dependentes químicos.

E lembre-se: sem um médico, não deveria ser permitido uso de medicações!

Não entenda como uma crítica à este modelo, mas a advertência tanto a pacientes em busca de ajuda quanto a famílias desesperadas com o problema que enfrentam em casa: façam uma boa pesquisa, visitem o lugar, façam questão de conhecer o psiquiatra e psicólogo responsável.

Sejam claros durante a entrevista com os responsáveis acerca de como é feito o tratamento, como é feita a prevenção e enfrentamento de agressões físicas ou verbais, e se possível tentem conversar com pacientes internados ou com suas famílias.

Estes serviços não podem fazer internações involuntárias – a RDC29/2011 que as regula é bem clara neste aspecto, parte-se do princípio da voluntariedade do tratamento.

Infelizmente são muitos os serviços que atuam ilegalmente neste aspecto, fazendo sequestros (vendidos como resgates ou remoções), e cárcere privado (vendido como tratamento involuntário).

Os preços são mais convidativos que os preços de clínicas psiquiátricas porém as garantias de um atendimento digno e tratamento sério obviamente são menores – os conselhos de classe (CRM, CRP, COREN, …) não fiscalizam, e sim as vigilâncias sanitárias locais, classicamente ineficazes em sua função de polícia na fiscalização.

Clínicas Psiquiátricas Especializadas no Tratamento da Dependência Química

As Clínicas Psiquiátricas Especializadas na Reabilitação e Tratamento de Dependentes Químicos devem necessariamente se adequar a RDC50. Devem ter inscrição ativa no Conselho Regional de Medicina (CRM) e no Ministério da Saúde – através do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES).

Os portais do Conselho Regional de Medicina do Estado  e do CNES permitem a consulta pública.

A responsabilidade técnica (seja na forma de Direção-Técnica ou Direção-Clínica) é necessariamente médica, seja um psiquiatra ou um clínico especializado.

Possuem projeto terapêutico bem definido, via de regra contando com equipe de profissionais de saúde completa para o tratamento de transtornos mentais no geral – além do psiquiatra, tal equipe em geral contempla psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais e enfermeiros.

Em algumas clínicas especializadas aliam-se aos profissionais de saúde consultores em dependência química, geralmente responsáveis por grupos de AA/NA, porém o foco do tratamento não é a programação dos “12 Passos”.

Os atendimentos psiquiátricos são individuais, assim como os psicológicos.

Além disso geralmente oferecem-se grupos terapêuticos diários, além de grupos de conscientização sobre a doença.

As clínicas mais preparadas oferecem atividade física supervisionada por professores de educação física.

São os únicos serviços legalmente habilitados a oferecer tratamento involuntário, desde que respeitem a legislação vigente – o médico responsável deve comunicar o Ministério Público Estadual (MPE) dentro de até 72h da chegada do paciente (período no qual a equipe terapêutica tentará convencer o mesmo a aceitar o tratamento voluntariamente) e a família deve concordar com o procedimento. A alta também deve ser comunicada ao MPE dentro do mesmo prazo. (Leia entrevista do autor a Revista Anônimos sobre o tema).

Riscos da Internação de Dependentes Químicos em Clínicas Irregulares

O tratamento da dependência química / adicção é uma área com grande repercussão não somente familiar mas também social.

Isso porque a maior parte dos dependentes químicos que conseguem a recuperação abandonam eventuais envolvimentos com atos ilícitos pregressos, por exemplo.

Mas infelizmente as manchetes não nos deixam esquecer que ainda existem depositários humanos, onde as famílias sequer tem acesso às instalações das “clínicas” em questão.

Dica importante: exija conhecer todas as instalações do serviço, inclusive pergunte pelas áreas de isolamento ou “contenção”. Avalie atentamente o que é oferecido em contrato, e sempre cobre dos administradores tais pontos.

Em algumas situações não será possível acompanhar o paciente à Clínica.

Nos casos em que a internação é involuntária, a família enfrenta um problema ainda mais delicado.

Em se tratando do SUS, o SAMU poderia ser acionado. Mas se o paciente não aceita a remoção será necessário acionar também a polícia militar para fazer a escolta dos profissionais da saúde.

A dependência química acaba ficando para o fim da lista de prioridades dentro das limitações estruturais do SAMU.

A opção é contratar uma “equipe de resgate” para fazer o transporte.

Existem diversas empresas de remoção “especializadas” no mercado, e eu considero essa fase da intervenção bastante crítica.

Isso porque é um momento de elevada tensão, e que muitas vezes constitui a “1a impressão” que o paciente terá do tratamento como um todo.

Então sempre busque indicações e informações pormenorizadas a respeito não só da clínica como da empresa que fará a remoção.

Conclusão

A decisão de intervir em qualquer familiar ou funcionário dependente químico é algo delicado. Sempre que possível converse com algum profissional de confiança e isento, que poderá encontrar a melhor forma de tratamento indicada.

Para citar esse artigo pelas normas ABNT

AMADERA, Gustavo Daud. Tratamento da Dependência Química – Adicção. KIAI.med.br, 2020. Disponível em: <https://kiai.med.br/formas-de-tratamento-da-dependencia-quimica-adiccao/>. Acesso em: 2 de jan. de 2020.

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